Rodrigo Maceira Rodrigo Maceira

Um ano bom

Um ano bom. Anarqueologias da vida.

A ideia da Avenida é antiga. Ela surgiu e variou de forma. Nos últimos dois anos, mesmo que ainda em processo, ganhou uma cara mais dela, encarnou projetos que ajudam quem vê de fora a entender melhor o que está conhecendo.

Em 2024, nós mudamos do térreo do Conjunto Zarvos para o décimo andar do mesmo edifício. De onde a gente tem uma vista fabulosa de uma parte pequenininha - e densa - da história de São Paulo. Quando cavamos o miolo da Avenida São Luis, encontramos o ponto inaugural de linhas que parecem fugir para a cidade inteira. Em 2025, tivemos a chance de terminar de arrumar o espaço e receber amigos, conhecidos, desconhecidos, em visitas pontuais ou nos nossos cursos.

Pensamos numa trilogia - conseguimos cobrir duas das ideias. Sempre com cursos que roubam nomes de vídeos da internet, partimos de “need ideas plz” para pensar as heranças da arte conceitual, das instruções e da vídeo-performance nos vídeos que assistimos online. A admissão de que essas relações são possíveis não precisa ser necessariamente adesista para descobrir diversos momentos bonitos da net art dos anos 2000 e mesmo de alguns virais que curtimos no TikTok ou inclusive em alguns dos exemplos mais “icônicos” do momento do AI slop de 2025. Falamos da famosa carta que Duchamp escreveu à irmã, com orientações sobre como (re)produzir um presente, olhamos muito para diversos dos event scores de Grapefruit, da Yoko; vimos vídeos virais e tomamos legendas, challenges e prompts como instruções da arte barata (pra quem precisa ser cara?) do dia a dia.

Continuamos nessa mesma trilha com “the loneliest you ever felt”. Costuramos a ideia de melancolia - do canônico “Problema XXX” - com a promessa de sermos todos artistas, alimentada pelo desenvolvimento técnico-midiático ao longo dos séculos XX e XXI. Com as plataformas de conteúdo, ganhamos a oportunidade de mostrar o que criamos numa escala que muitos “artistas” jamais conheceram ou projetaram. Inspeccionamos tentativas institucionais de sistematizar a arte amadora oriunda da cultura do conteúdo online e chegamos a acreditar que criar por amor talvez seja mais interessante (com certeza, mais apaixonante) que ser artista profissional. A internet dos milhões de influenciadores, o palco em que o número de tentativas é proporcional à freqüência do fracasso. Em algum lugar do mundo, em muitos lugares, mais um moleque está trancado no quarto, agora, olhando fixamente para a tela do telefone, se olhando, arriscando um vídeo e se desafiando diante do medo que tem do julgamento dos outros.

Poetry made by all.

Tivemos ainda a colaboração tremenda do Gustavo no curso “Escrita: entre a vida e a morte”. Experimentamos maneiras de viver e morrer com as diferentes superfícies do texto. Visitamos o cemitério da Consolação e tomamos dos mortos modelos para personagens que, inventando, fizemos viver.

Ganhamos ainda um cartaz novo criado pelo GVO. Ele deu também um leve refresh na identidade da Avenida. Sempre tudo muito lindo.

Por último: registramos "I can’t help myself ie”, excursão que fiz por São Paulo, propondo cada um de nós como esteio de alguém, esperando que, por isso, sejamos mais generosos com o que ajudamos (ou atrapalhamos) que os outros vejam em si mesmos.

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